sábado, 23 de abril de 2011

A VIDA DOS OUTROS (Das Leben der Anderen, Alemanha, 2006)


Quando eu assisti este filme eu tinha decidido não escrever sobre ele, pois pensei que ele já estava bastante conhecido e não precisava que eu o comentasse e corresse o risco de repetir o que já havia sido dito. No entanto, resolvi assisti-lo mais uma vez e cheguei a conclusão de que, de um jeito ou de outro, eu tinha que prestar minha homenagem a ele, esperando que vocês não tenham lido outros comentários.

Neste filme as técnicas de filmagem não são tão inovadoras e nem vanguardistas. O que o torna excepcional é a sua história. Ela se passa na Alemanha Oriental, em 1984, ou seja, o muro de Berlim ainda está de pé e o filme tem lugar na parte comunista. Durante a vigência dessas circunstâncias, o governo era plenamente arbitrário quando se queria vigiar alguém, e para isso não se precisava de motivação concreta, podendo-se, assim, grampear o telefone e o apartamento da pessoa em questão sem dificuldades. O personagem principal desta história é o agente encarregado de instalar o equipamento, escutar a vida do indivíduo, e reportar o que escutou para os superiores. Este agente recebe a incubência de vigiar um poeta e sua namorada, para descobrir se este escritor tem envolvimento com algum tipo de movimento anti-comunista, mas, ao entrar em contato com a vida do poeta, o agente escapa de sua disciplina e passivamente se envolve com a vida que está observando.

 
O que o agente passa a sentir com relação ao poeta e sua vida é uma admiração carinhosa, e como ele está testemunhando todos os momentos vivenciados, até mesmo os íntimos, ele começa a se importar e a prezar pela vida desse vigiado escritor. Isso põe em risco sua idoneidade profissional e o faz tentar acobertar seus próprios atos e os do poeta.

Para contar essa história o diretor se utiliza de uma fotografia acinzentada que se adequa perfeitamente ao sentimento calculista experienciado no período retratado. A imagem de prédios residenciais que mais parecem blocos de concreto, se encarrega de fazer transparecer a frieza e o tratamento impessoal com que as pessoas  tinham de conviver. Por isso, quando eu disse que a técnica de filmagem utilizada não é inovadora, eu não quis dizer que a realização desse filme foi fácil ou simples. A técnica usada foi usual, mas foi utilizada com maestria. Cada cena do filme é relevante e dura o tempo exato para se alcançar o sentimento demonstrado. Para isso, o filme também conta um elenco excepcional que trouxe um nível superior, capaz de envolver o espectador pela forma verossímil de como tudo é interpretado.

Os fatores acima eu só pude identificar após ter assistido o filme, mas existe um aspecto especial que despertou minha curiosidade antes mesmo de assisti-lo. Essa característica é o fato de ele ser um filme alemão, que fala da Alemanha Oriental. De maneira geral, são poucos os filmes que abordam esse período da história alemã. Existem incontáveis filmes que tratam do nazismo e da Segunda Guerra Mundial, mas é restrito o número de películas que explora o tema da Alemanha Oriental e do regime comunista experienciado lá. Este filme fez isso, e o fez com toda a propriedade. Uma vez que foi a própria Alemanha que o realizou, a forma autêntica como o tema foi explorado foi exata e eficaz. No filme os eventos são retrados da forma precisa como ocorreriam no período em questão. Não há romanticismos exagerados, ou uma luta do bem contra o mal, o que se vê é uma visão precisa do que era o comunismo na Alemanha Oriental, mostrando ainda um pouco da impunidade que esse regime transmitia para quem estava no poder. Essa veracidade das condições só podia ser transmitida por quem vivenciou esses desafios e conviveu com essas circunstâncias, e por isso este filme serve também como um retrato histórico preciso daquela época.

 
As situações transmitidas no filme apontam a um sentimento de submissão  vivido pela população e até por alguns militares, e todos tinham que obedecer uma rigorosa disciplina, pois quem não o fizesse seria arbitrariamente investigado e punido, independentemente de serem encontradas razões concretas para tal. E foi em um ambiente assim, frio, calculista, racional e no qual estava em jogo todo seu futuro profissional e até mesmo seu destino como cidadão, foram nessas circunstâncias que o personagem principal entra em contato com sua senbilidade mais comovente. Mesmo sendo ele próprio calculista, isso não o impede de sentir emoções, e, guiado pelo belo sentimento que elas lhe mostraram, ele salta para terras desconhecidas, sem deixar de ficar constantemente surpreso.


2 comentários:

  1. Fiquei fã do seu blog por esse textos, escrevemos de maneiras parecidas, até mesmo por essa fonte que é a única que eu uso. Fiz um blog há uns meses atrás e coincidentemente é parecido com o seu em alguns pontos. Queria propor parceria entre eles, meu blog é o http://ozymandiasrealista.blogspot.com.br/

    Qualquer coisa é só me contatar pelo blog.

    Força e honra.

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  2. Um dos melhores filmes que já assisti e, sem sombra de dúvida, um dos melhores filmes alemães. Eu o assisti em 2008 pela primeira vez, mas ele deixou essa marca inesquecível que somente grandes filmes e grandes livros deixam e que o tornam um clássico. Obrigada pelo texto.

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