THE ARRIVAL (The Arrival, Shaun Tan, 2006)

Ter contato com esta obra foi um deleite surpreendente. Ela é um exemplo indiscutível de que obras que se utilizam dos quadrinhos podem transmitir tantas emoções quanto uma obra literária. Mas este livro ousa ainda mais, além de se utilizar de quadrinhos, seu autor não inclui uma palvra escrita sequer em suas páginas. Tudo é só imagem. Trata-se, na verdade, de um trabalho sequencial de quadrinhos, também conhecido como picture book, e, como foi dito, são os desenhos que contam a história, no caso deste livro, contam uma história surpreendentemente emocionante.

O enredo é simples, o livro conta a história de um homem que imigra para outras terras a fim de obter trabalho e alcançar uma melhor condição de vida, para então trazer sua mulher e filha para junto de si novamente.

Como eu disse, o enredo é simples, mas essa mesma história é reiteradamente encenada na vida real. Ela é a história de todos os imigrantes que possuem em comum o objetivo de melhorar de vida em terras alienígenas. O embate enfrentado por esses corajosos indivíduos foi magistralmente representado por Shaun Tan neste livro que delicadamente aborda inclusive detalhes sobre a família.

Os desenhos nesta obra são bem reais e as pessoas, objetos e paisagens parecem ter sido fotografadas. Explorando esse realismo visual, Shaun Tan transparenta os detalhes das expressões faciais e com isso as emoções vividas pelos personagens ficam genuinamente representadas no papel. É impressionante a autenticidade dos personagens e a maneira como expressões corporais e faciais contam detalhadamente essa história repleta de sensibilidade.

Mesmo podendo essa história ser encontrada no mundo real, a forma como ela foi contada é prazerosamente original. Neste livro, o realismo dos desenhos é mesclado com a fantasia metafórica que serve para descrever o ambiente que envolve os personagens, e assim o autor dá o teor particular desta história que a destaca das demais. Fazendo personagens e ambientes fantasiosos, o autor faz com que essa história possa ser assimilada por crianças sem que elas fiquem chocadas com o teor emocional presente no livro. Mas tenham uma coisa em mente, este livro não é para crianças. Ele pode ser visto por crianças, mas elas não irão compreendê-lo em sua totalidade. Falo isso sem menosprezar os jovens, mas o digo porque as emoções, os sentimentos e a própria situação dos personagens no livro são emocionalmente complexas e para serem interpretadas é preciso uma certa maturidade. Tenham certeza de que à medida que eu for evoluindo eu irei revisitar este livro e, também com certeza, irei extrair mais lições dele.

  

Como foi afirmado, o ambiente ilustrado neste livro é fantasioso, mas sem ser espacial ou futurista, é uma fantasia realista, e seus elementos imaginários servem de símbolos, possuindo um significado plural, e não individual. Essa opção tornou esta história única mas ao mesmo tempo universal, sem se restringir a uma localidade específica, ou a um tempo determinado. Já é uma certeza para mim de que este livro irá perdurar pelo tempo pois sua história, e a forma como ela foi contada, torna-o atemporal.

Não há uma idade que retrinja a “leitura” deste livro. O fato de possuir apenas imagens não torna esta obra mais fácil de ser admirada. Para proveitosamente apreciá-la, cada quadrinho deve ser interpretado e não apenas visto, os sentimentos das personagens devem ser sentidos e não apenas passados de relance, a arte que aqui apenas se utiliza de tonalidades de preto e branco precisa ser enaltecida e não menosprezada. Para que tudo isso ocorra é preciso reservar tempo de contato com esta obra, e, uma vez que ela pode começar a ser assimilada ainda quando criança, continuando a mostrar cada vez mais sua beleza, seria uma experiência deslumbrante crescer junto com este livro, pois uma arte tão bela iria fazer qualquer infância inesquecível.